O segundo mega-ataque aéreo da Rússia contra a Ucrânia nesta semana confirma a suspeita de especialistas e militares de Kiev de que o governo de Vladimir Putin está economizando mísseis de precisão para uma nova campanha contra o país invadido em 2022.
Foram lançados nesta sexta (08/11) 92 drones e apenas cinco mísseis sobre 12 regiões ucranianas, deixando ao menos uma pessoa morta e outras 38, feridas. As Forças Armadas de Kiev dizem ter derrubado 62 dos aviões-robôs e quatro mísseis.
A ação foi a mais longa da guerra nos céus de Kiev, durando 9h57min, em que quatro pessoas foram feridas, uma gravemente. Mas o estrago maior ocorreu em Kharkiv, a segunda maior cidade do país, onde 25 pessoas ficaram feridas. Já a morte ocorreu em Odessa.
Na véspera, haviam sido 106 drones e apenas um míssil. É um padrão: em setembro, foram lançados 700 drones e 151 mísseis, nas contas de Kiev. Já em outubro, foram 84 mísseis e 2.023 drones, um recorde no conflito.
“A Rússia usa os drones, apesar de sua baixa eficácia, para economizar mísseis”, disse à agência ucraniana Interfax Andrii Kovalenko, chefe do Centro para Conter Desinformação, de Kiev. O objetivo presumido é a esperada campanha de inverno de Moscou contra o sistema energético da Ucrânia.
Um analista próximo do Ministério da Defesa da Rússia diz esperar um golpe duro a partir da estação, que no Hemisfério Norte começa em 21 de dezembro.
Moscou já reduziu a um terço a capacidade de produção de energia do rival ao longo deste ano, e deixá-lo no escuro e sem aquecimento com mega-ataques de mísseis de precisão ampliaria a pressão sobre o governo de Volodimir Zelenski.
Drones são relativamente baratos, com os modelos suicidas de desenho iraniano usados pela Rússia custando algo como US$ 20 mil (R$ 113 mil hoje). Já um míssil de cruzeiro Kalibr, por exemplo, sai por qualquer coisa entre US$ 1 milhão e US$ 6,5 milhões (de R$ 5,7 milhões a R$ 37 milhões), dependendo da versão.
Circunavegando sanções, usando países como intermediários e adquirindo material de uso dual, a Rússia manteve sua produção estável ao longo da guerra, contrariando as previsões iniciais.
Modulando o emprego de seus modelos mais preciso e eficazes enquanto degrada capacidades de defesa antiaérea de Kiev, Moscou por ora manteve e até aumentou o ritmo de suas ações nos céus ucranianos.
Nesta sexta, Zelenski voltou a apelar aos parceiros ocidentais na guerra. “Defesa aérea, capacidades de longo alcance, pacotes de armas, sanções contra o agressor. Essa é a resposta que precisamos, não apenas em palavras, mas também em ações”, escreveu no Telegram.
O ucraniano está sob pressão há meses, desde que Putin retomou a iniciativa no leste do país -só na semana passada, tomou 200 km2 de território na região de Donetsk, a maior ação desde a invasão.
A resposta de Zelenski, a invasão da região de Kursk, não deu certo. Se conseguiu humilhar o rival com a primeira ação estrangeira em solo russo desde a Segunda Guerra Mundial, não logrou avanços e suas tropas estão sendo expulsas gradualmente.
O objetivo presumido de desviar recursos da guerra russa na Ucrânia não deu certo, e as negociações de paz que se insinuavam foram congeladas temporariamente. Segundo o canal de Telegram ucraniano Deep State, há sinais de que Moscou já reuniu 45 mil soldados para uma ofensiva final em Kursk.
Entre eles, diz Kiev, estariam os norte-coreanos que Otan, EUA e Coreia do Sul dizem ter sido enviados para treinamento na Rússia, como parte do tratado de defesa mútua assinado este ano por Putin e o ditador Kim Jong-un. O russo sugeriu que poderia empregar as forças do aliado, sem confirmar isso.
Desde então, o tema da Coreia do Norte foi para o topo da retórica de Zelenski. Do lado ucraniano, há mercenários estrangeiros, mas oficialmente nenhuma força aliada – embora todo o esforço de guerra de Kiev dependa de ajuda militar ocidental.
Para completar o cenário sombrio para o ucraniano, Donald Trump foi eleito nos EUA. Espera-se que o republicano force Kiev a aceitar perdas territoriais para encerrar a guerra.
(Igor Gielow/Folhapress)