04/12/2024
04:55

Pendrive de ‘kid preto’ tinha detalhes de plano de golpe de Estado contra Lula e Moraes

Pendrive de ‘kid preto’ tinha detalhes de plano de golpe de Estado contra Lula e Moraes

BRASÍLIA – Um pendrive apreendido pela Polícia Federal (PF) com o tenente-coronel Hélio Ferreira Lima, integrante dos “kids pretos”, as Forças Especiais do Exército, armazenava documentos detalhados que descrevem o planejamento de um golpe de Estado no Brasil para evitar a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O militar, que era lotado em Goiânia (GO), está preso desde 19 de novembro, quando foi detido no aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro, no desencadeamento da Operação Contragolpe. Ele é um dos 37 indiciados no inquérito finalizado há uma semana e que trata de supostas tramas golpistas.

Ferreira Lima e outros quatro “kids pretos”, como são conhecidos informalmente por usarem gorros pretos nas operações, são acusados de planejar a morte de Lula, seu vice, Geraldo Alckmin (PSB), e do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), com envenenamento e ataque a tiros e bombas.

A PF diz ter provas de que Ferreira Lima monitorou Moraes e Lula em 2022. “Hélio Ferreira Lima viajou do Rio Grande do Sul para Goiânia e se deslocou juntamente com Rafael de Oliveira para a cidade de Brasília no dia 21/11/2022 para iniciar as atividades de monitoramento do ministro Alexandre de Moraes”, diz o relatório da PF.

Rafael de Oliveira é outro “kid preto”. Ele e Ferreira Lima estavam no Parque da Cidade, em Brasília, onde também estava Moraes, para “executar a prisão/execução” do ministro, em 12 de dezembro de 2022, conforme localização de celular que estava com os militares – dado recuperado por peritos. O atentado foi abortado de última hora, segundo a investigação.

Os “kids pretos” alvos da Operação Contragolpe foram indiciados pela PF no dia 21 último pelos crimes de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e organização criminosa, que, juntos, podem resultar em até 28 anos de prisão. Já o pendrive de Ferreira Lima foi encontrado na Operação Luneta.

O resultado desta última operação foi divulgado esta semana, após Alexandre de Moraes suspender o sigilo do inquérito que levou ao indiciamento de 37 pessoas e todas as operações relacionadas ao mesmo tema.

A Operação Luneta descreve como os documentos encontrados no pendrive tinham uma planilha detalhada descrevendo “fatores estratégicos de planejamento” divididos em colunas com nomes “fato”, “dedução” e “conclusão”.

O plano envolvia uso de fake news para desacreditar o processo eleitoral brasileiro e incitar a população para ir às ruas contra a chapa presidencial eleita em 2022, pedindo intervenção militar.

O plano detalhado no pendrive também previa a realização de uma nova eleição, após a prisão de Lula e de ministros do STF e a criação de um gabinete de crise. Ele cita como alvos Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes.

Os poderes do STF seriam transferidos ao Superior Tribunal Militar (STM), ainda conforme o plano de golpe de Estado apreendido com o “kid preto”. Também havia no pen drive uma carta que seria publicada ou lida por Jair Bolsonaro para fechar o STF e convocar as Forças Armadas na tomada do poder.

“Afinal, diante de todo o exposto e para assegurar a necessária restauração do Estado Democrático de Direito no Brasil, jogando de forma incondicional dentro das quatro linhas, com base em disposições expressas da Constituição Federal de 1988, declaro o Estado de Sítio; e, como ato contínuo, decreto Operação de Garantia da Lei e da Ordem”, diz trecho do documento.

PF diz que documento em pendrive reforma evidência contra Bolsonaro
Para a PF, o documento é um “ensaio retórico” preparado para ser lido em caso da concretização do golpe de Estado. Investigadores dizem que ele reforça a evidência de que o ex-presidente não só sabia como estava à frente de tudo.

“Os elementos de prova obtidos ao longo da investigação demonstram de forma inequívoca que o então presidente da República, JAIR MESSIAS BOLSONARO, planejou, atuou e teve o domínio de forma direta e efetiva dos atos executórios realizados pela organização criminosa que objetivava a concretização de um Golpe de Estado e da Abolição do Estado Democrático de Direito, fato que não se consumou em razão de circunstâncias alheias à sua vontade”, diz trecho de relatório da PF.

“O arcabouço probatório colhido indica que o grupo investigado, liderado por JAIR BOLSONARO, à época presidente da República, criou, desenvolveu e disseminou a narrativa falsa da existência de vulnerabilidade e fraude no sistema eletrônico de votação do País desde o ano de 2019, com o objetivo de sedimentar na população a falsa realidade de fraude eleitoral para posteriormente a narrativa atingir dois objetivos: primeiro, não ser interpretada como um possível ato casuístico em caso de derrota eleitoral e, segundo e mais relevante, ser utilizada como fundamento para os atos que se sucederam após a derrota do então candidato JAIR BOLSONARO no pleito de 2022”, prossegue a PF.

Bolsonaro admitiu possibilidade de decretação de estado de sítio
Bolsonaro vem negando em entrevistas qualquer intenção de golpe de Estado. “Uma loucura falar em golpe, uma loucura. Golpe com um general da reserva e cinco oficiais? E outra coisa, golpe existe em cima de uma autoridade constituída, que já tomou posse. O Lula tinha tomado posse? Ninguém tinha tomado posse. Só se fosse em cima de mim o golpe”, declarou Bolsonaro em Brasília, na segunda-feira (25).

Na mesma ocasião, o ex-presidente afirmou que chegou a analisar a possibilidade de decretar estado de sítio após a eleição presidencial de 2022, mas descartou a medida e negou qualquer envolvimento em planos de golpe de Estado. Ele afirmou que todas as ações avaliadas respeitaram os limites constitucionais. “Jamais faria algo fora das quatro linhas”, declarou.

O estado de sítio é a medida mais extrema prevista pela Constituição e pode ser acionado pelo presidente em situações que ameacem a ordem e estabilidade do país, como uma grave comoção nacional, estado de guerra ou agressão estrangeira. Está regulado na Constituição e exige autorização do Congresso Nacional, após consulta ao Conselho da República e ao Conselho de Defesa Nacional, que emitem pareceres não vinculativos sobre a necessidade da medida.

Após a autorização, o presidente pode suspender garantias constitucionais, como o sigilo de comunicações e a liberdade de reunião. O decreto deve especificar a duração da medida, as normas aplicáveis e as garantias suspensas, com o estado de sítio limitado a 30 dias, prorrogáveis por períodos iguais, sempre com nova aprovação do Congresso.

 

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