A Usiminas, uma das maiores siderúrgicas que atuam no Brasil, mandou comunicado ao mercado nesta segunda-feira (29/7) afirmando que a concorrente CSN (que também é sua acionista) não cumpriu decisão judicial de vender a participação que detém na concorrente. Segundo a siderúrgica com sede em Ipatinga, Vale do Aço, a determinação é do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
Em Fato Relevante emitido nesta segunda (29/7), a empresa comunica: “A Usinas Siderúrgicas de Minas Gerais S.A. – USIMINAS (“Usiminas” ou “Companhia”) vem pelo presente confirmar a existência de decisão, no âmbito de ação judicial atualmente em curso e que corre em segredo de justiça, que determinou à Companhia Siderúrgica Nacional – CSN reduzir sua participação na Usiminas de 12,9% para menos de 5% do capital social, por meio da alienação de ações, na forma do Termo de Compromisso de Desempenho – TCD celebrado em 2014 entre a CSN e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE”, informou.
A Usiminas também confirma que houve o decurso do prazo estipulado pelo juízo para a alienação das ações, “sem que a CSN tenha cumprido tal decisão judicial”, completou.
Mais capítulos da briga entre acionistas
A disputa entre CSN e Termium, ambas acionistas da Usiminas, ganhou novo capítulo nos últimos dias. A Quarta Turma do TRF-6 (Tribunal Regional Federal da 6ª Região) manteve uma decisão de primeira instância que obriga a CSN a vender suas ações da Usiminas até ter sua participação reduzida a menos de 5% do capital total. Hoje, a companhia tem cerca de 12% dos papeis da rival.
Usiminas e CSN estão entre as maiores produtoras de aço plano do Brasil (juntas, concentram 70% do mercado) e têm como concorrentes Gerdau e ArcelorMittal.
A discussão na Justiça Federal de Minas Gerais foi apresentada pela Usiminas contra o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). O objetivo era manter os efeitos de um termo de compromisso fechado em 2014, que dava prazo de cinco anos para que a CSN vendesse as ações da rival.A CSN começou a adquirir ações da Usiminas em 2011 até chegar a 17,43%, tornando-se o principal acionista individual. A Usiminas viu nisso uma tentativa de ganhar influência sobre uma concorrência, e por isso recorreu ao Cade, que, por sua vez, determinou que a CSN vendesse os papéis para menos de 5%.
Esse prazo não foi cumprido e, três anos depois de expirado, em 2022, foi alterado pelo próprio Cade. Nessa ocasião, a maioria dos conselheiros decidiu que a CSN poderia manter a participação acionária por tempo indeterminado, desde que não usasse os papéis para exercer direitos políticos (como votação em assembleias de acionistas). No julgamento do TRF-6, porém, o procurador regional da República Darlan Airton Dias afirmou que, ao retirar o prazo de liquidação, o Cade tornou vulnerável a concorrência. “Passados dez anos, a obrigação necessária à reparação da prática anticoncorrencial nunca foi cumprida”, escreveu.
O juiz federal Ricardo Machado Rabelo, relator do caso no TRF-6, considerou que o Cade, ao permitir a rediscussão do que já havia sido definido em 2014, criou insegurança jurídica e violou a garantia da coisa julgada. O acórdão determinou que fosse mantida a sentença de primeiro grau e o prazo de um ano para o desinvestimento da CSN, determinado em 29 de junho de 2023 -prazo esse que venceu, portanto, em junho deste ano. O Cade recorreu.
Disputa no STJ teve reviravolta
Há pouco mais de um mês, a Ternium foi condenada, no STJ (Superior Tribunal de Justiça), a indenizar a CSN em R$ 5 bilhões, no que foi visto no meio jurídico como uma reviravolta. O caso discutia se houve ou não mudança no controle da Usiminas quando a empresa ítalo-argentina comprou, em 2011, as participações de Votorantim e Camargo Corrêa na siderúrgica, obtendo 27,7% das ações. Com a compra, a Ternium passou a intregar o grupo de controle, do qual também faziam parte Nippon e a Caixa de Empregados da Usiminas.
A CSN foi à Justiça por entender que houve alienação do grupo de controle quando a Ternium passou a integrá-lo, caso em que a empresa ítalo-argentina precisaria ter feito uma oferta aos minoritários -o dispositivo chamado de tag along. A CSN acumulou algumas derrotas na Justiça de São Paulo e no STJ. A reviravolta aconteceu a partir de embargos de declaração (expediente que serve para apontar incoerência ou dirimir dúvidas).
Uma mudança na composição da Terceira Turma fez com que outro ministro fosse chamado a desempatar o caso, e ele votou a favor da CSN. Por maioria de votos, a Terceira Turma do tribunal considerou que a Ternium fez uma mudança “escamoteada” no controle da Usiminas. Um dos argumentos da CSN ao apontar mudança no controle na entrada da ítalo-argentina foi o comunicado feito pela Usiminas, em 2023, de que a Termium passaria a ter 61,3% das ações vinculadas (que dependem de acordos de acionistas para que depois tenham direito a voto), assim como o direito de nomear o diretor-presidente e outros integrantes da administração.
A CSN considera que o comunicado apenas formalizou o que já se sabia: que a Ternium controlava a Usiminas. Outro indício era o preço pago pelas ações da siderúrgica, que teria sido alto. “Ainda que o [pagamento de ágio na compra das ações] não signifique controle, o fato de adquirir por valor quase o dobro acima do mercado é componente indiciário de que a Ternium não queria a mesma posição da Camargo Correa e Votorantim [acionistas que venderam suas participações à Ternium]. Ainda que escamoetado por critérios técnicos, ela queria assumir o controle da Usiminas”, disse o ministro Antonio Carlos Ferreira.
A Ternium defende que discussão levada ao STJ nem deveria existir, pois a CSN já deveria ter se desfeito das ações de sua concorrente em 2019. Esse argumento vem do acordo firmado no Cade em 2014, que dava cinco anos para a liquidação. A Termium é parte do conglomerado ítalo-argentino Techinit, fundado em Milão em 1945. A ação no STJ fez com que até mesmo o governo italiano se envolvesse na discussão. Repetidas vezes, o governo italiano manifestou ao brasileiro a preocupação com a possibilidade de decisão contrária ao conglomerado do país europeu.
O ministro das Relações Exteriores da Itália, Antonio Tajani, falou sobre o assunto com o colega Mauro Vieira. Cartas foram enviadas falando na possibilidade de insegurança jurídica e risco para os investimentos produtivos entre os dois países.