O América foi a “escola da carreira” de Alexandre Mattos. Multicampeão por diversos grandes clubes do Brasil e hoje CEO de futebol do Cruzeiro, o belo-horizontino iniciou a trajetória vitoriosa como dirigente no Coelho, em 2005, durante a maior crise da história do clube, que, à época, estava na Série C do Campeonato Brasileiro e tinha receita anual de apenas cerca de R$ 40 mil, segundo ele.
O pontapé inicial da caminhada de Mattos no clube alviverde se deu por acaso, de forma voluntária. Em entrevista ao Charla Podcast, o executivo contou que tudo começou com um encontro inesperado entre o pai e Afonsinho, ex-jogador e presidente histórico do América (os dois eram amigos), na padaria: “naquele dia, ele estava renunciando, porque o time estava na Terceira Divisão Nacional, com sete meses de salário atrasado. Disse ao meu pai na hora: ‘fala para o Afonsinho que eu arrumo o América para ele’“.
Afonsinho, então, indicou Alexandre a Antônio Baltazar, que o substituiria em um mandato “tampão” e, seis meses depois, seria eleito para um triênio. O aspirante a diretor tinha “entre 27 e 28 anos” à época e contou que, na primeira conversa com Baltazar, recebeu a pergunta: “O que você quer fazer no América?”. “Tudo”, respondeu Mattos. “Claro que o futebol é o foco, mas quero estar dentro do clube, estudei para isso, você vai me conhecer, sou muito intenso”, continuou.
Pouco depois, os dois começaram a trabalhar juntos: “Fiquei entre dois anos e meio e três anos como assessor do Baltazar, de forma voluntária, enquanto também era dono de uma academia em BH. Fomos criando uma relação muito forte, até que chegou o dia em que eu definitivamente entrei no futebol”.
O divisor de águas para Mattos no América
No final de 2005, novamente por acaso, Mattos ganhou a oportunidade de ouro para mostrar que poderia ganhar um papel de maior importância no América. E não desperdiçou.
“O América tinha feito uma Série C muito ruim, estava cheio de dívidas, sem dinheiro. O Baltazar entrou para colocar dinheiro próprio, a receita anual era de 30 a 40 mil reais. Uma coisa bisonha. Ao fim do ano, a tinha uma leva de 15 a 17 jogadores para sair e não tínhamos dinheiro, então o Baltazar, com quem aprendi muito a negociar, marcou um dia inteiro para resolver todas as pendências, um jogador de cada vez”. Nesse dia, no entanto, o então presidente teve um problema no hospital que administrava e não conseguiria ir. Assim, delegou a missão a Mattos, com os seguintes dizeres: “Não confio em mais ninguém para resolver isso, só em você”.
Alexandre contou que, à época “não entendia nada de rescisão” e assuntos afins. A tarefa era difícil: ele não poderia simplesmente dispensar os jogadores, pois “o clube não tinha dinheiro” para arcar com as multas rescisórias. Assim, teria que tentar fazer acordos para economizar: “Tinha uma folha anotada com as metas (de acordos), tipo: ‘se a dívida com o jogador for de R$ 100 mil, vamos tentar parcelar em 30 vezes’”.
O primeiro atleta com quem Mattos negociou foi quem mais o marcou, segundo ele. “Sentei com o primeiro e pensei: ‘Esse vai definir os outros, porque vou ganhar confiança’. Ele chegou dizendo; ‘vamos fazer o acordo logo, tenho que ir embora, já acertei com outro clube, estou indo pro interior de São Paulo’. A rescisão dele era R$ 15 mil. A folhinha (de instruções) dizia para, nesse caso, fazer um acordo para dividir o valor em 20 vezes, mas não quis fazer isso. Fui à tesouraria, peguei dinheiro vivo e disse a ele: ‘Nós não temos dinheiro, se assinarmos (um acordo para parcelar a multa) não vamos resolver nada. Tenho R$ 2 mil, pega o dinheiro e mata isso de uma vez’”, disse. Após relutar um pouco, o jogador topou. E, dessa maneira, as negociações foram fluindo.
“Resumindo a história toda, conseguimos abaixar tudo, só um ou outro deu um problema maior. No final do dia, foi uma economia enorme, coisas muito melhores. No dia seguinte, o Baltazar me chamou e disse: ‘você agora é o cara aqui para mim, você vai tocar isso aqui, negócio, futebol, contratar, vender, você vai filtrar e nós vamos fazer isso aqui’”, finalizou Mattos. Assim, ele se tornou diretor executivo de futebol do clube.
O América foi uma escola para mim, lá eu tive que entrar em tudo. Os problemas lá são os mesmos (em comparação com os gigantes do futebol em que ele trabalhou), o que muda é a exposição e os números.
Alexandre Mattos, diretor
Mattos ajudou a reconstruir o América
Nos anos seguintes, em que Mattos buscava reconstruir o clube, o América continuou em fase dramática dentro de campo: em 2006, foi eliminado de forma precoce na Série C e no Mineiro e, em 2007, foi rebaixado pelo Módulo II do Estadual pela primeira vez na história, ficando sem divisão nacional.
Em 2008, o torcedor alviverde voltou a ter alegrias: viu o Coelho sagrar-se campeão do Módulo II e voltar à Terceira Divisão Nacional. No ano seguinte, veio a conquista do título da Série C, que levou o time de volta à Série B após seis anos.
Em 2010, o trabalho de reconstrução comandado por Mattos se consolidou: o América conseguiu novo acesso – desta vez, para a Série A do Brasileiro. O Coelho, assim, voltaria para a elite do futebol nacional depois de nove anos longe dela.
Saída do América e consolidação no cenário nacional
No fim de 2011, ano em que o alviverde amargou o rebaixamento para a Segunda Divisão, Mattos anunciou a saída do clube. Em 2012, ele assumiria o Cruzeiro, onde montou o time que foi bicampeão brasileiro (2013 e 2014) e campeão mineiro (2014).
Alexandre também teve passagem vitoriosa pelo Palmeiras – foi, novamente, bicampeão brasileiro (2016 e 2018) e ainda venceu a Copa do Brasil (2015). Além disso, deixou sua marca no Atlético, onde conquistou o Mineiro de 2020 e ajudou a montar a equipe que viria a ser campeã do Brasileiro, da Copa do Brasil e do Estadual em 2021, e no Athletico-PR, onde venceu o Paranaense de 2023 e foi vice-campeão da Libertadores no mesmo ano.
Retorno ‘relâmpago’ em 2024
Em abril de 2024, Mattos depois de passagem “relâmpago” pelo Vasco, Alexandre retornou ao América, mas, após apenas 15 dias, deixou o cargo para assumir a diretoria executiva do Cruzeiro a pedido do empresário Pedrinho.