O dólar fechou em alta de 1,33%, a R$ 5,4854, nesta terça-feira (20). Este é o maior valor da divisa americana ante o real desde o último dia 12, segundo dados da CMA. Já o Ibovespa teve ganho de 0,22%, a 136.087 pontos, renovando o recorde alcançado na véspera.
Neste pregão, investidores repercutiram a entrevista de Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, ao jornal O Globo. Nela, o economista diz que a decisão do próximo Copom está indefinida e que o comitê ainda não sabe ao certo se o risco de alta ou queda da inflação são equivalentes.
“Há opiniões divergentes no grupo sobre o balanço de riscos, se são simétricos ou não. A gente vai decidir no próximo Copom”, disse Campos Neto à jornalista Míriam Leitão.
Após o último Copom sinalizar a possibilidade de subir juros, o mercado passou a precificar uma alta de 0,5 ponto percentual na reunião de setembro. Com as falas de Campos Neto, essa possibilidade fica mais incerta, dizem especialistas.
“Há dois fatores principais por trás da alta do dólar. O primeiro é externo, ligado a commodities agrícolas e ao petróleo, que se desvalorizam e impactam as divisas de países exportadores dessas matérias-primas. O segundo é interno, com o discurso de Campos Neto”, diz Nicolas Borsoi, economista-chefe da Nova Futura Investimentos.
Nesta terça, o peso mexicano, rublo russo e o rand sul-africano se desvalorizam em magnitudes semelhantes à desvalorização do real. Do lado das commodities, o barril de petróleo Brent (referência internacional) recua 0,53%, a US$ 77,25. A tonelada do minério de ferro, por sua vez, subiu 1,21%, a US$ 99,45 dólares na Bolsa de Mercadorias de Dalian (DCE), na China.
“Campos Neto deu um sinal de que o BC não está tão confortável com essa visão do mercado de que ele vai subir juros. Nos últimos dias ele e o [Gabriel] Galípolo meio que deram uma tirada de pé”, afirma Borsoi.
Galípolo, diretor de política monetária do BC, enfatizou na véspera que a ata do Copom sinaliza que o comitê aguarda novos dados macroeconômicos para definir o futuro da Selic. As falas também repercutem no mercado de juros futuros. Os títulos de longo prazo subiram, enquanto os mais curtos recuaram.
O juro para janeiro de 2025 terminou o dia cotado a 10,785%, uma queda de 0,06 ponto percentual ante a véspera. O contrato para janeiro de 2027 subiu 0,005 ponto percentual, para 11,42%. Já o título com vencimento em janeiro de 2028 tem alta de 0,05 ponto percentual, para 11,435%.
“Os juros de médio e longo prazo estão subindo bem hoje, praticamente apagando as quedas de ontem e isso está levando o dólar junto”, completa o economista. Segundo André Galhardo, consultor econômico da Remessa Online, as falas dos membros do Copom são, algumas vezes, mais valiosas até mesmo que dados concretos.
Para o economista, Galípolo tem dado declarações mais “hawkish”, ou seja, que indicam combate à inflação, enquanto Campos Neto tem adotado um tom mais “dovish”, que indicam queda de juros. “Em falas recentes, Campos Neto adotou um tom mais brando sobre um eventual aumento na taxa de juros e afirmou que a inflação e componentes de inércia e do potencial inflacionário vindo oriundo da consistente melhora do mercado de trabalho. Tais discursos fizeram com que a moeda norte-americana revertesse a tendência dos últimos dias e ganhasse força nesta terça”, afirma Galhardo.
O mercado ainda reflete a expectativa da ata da última reunião do Fed (Federal Reserve, o BC dos EUA), , que sairá nesta quarta (21), e o discurso do presidente do Fed Jerome Powell no simpósio de Jackson Hole, na sexta-feira (23).
Segundo Paulza Zogbi, gerente de conteúdo e research da Nomad, a alta do dólar ante o real também é fruto de um movimento de correção após fortes valorizações da moeda brasileira nas sessões anteriores.
Na segunda (19), o dólar caiu 0,99%, cotado a R$ 5,413, e a Bolsa avançou 1,36%, aos 135.777 pontos -o maior patamar da história do mercado acionário brasileiro. Antes, a maior cifra do fechamento era 134.193 pontos, atingida no dia 27 de dezembro de 2023.
“Nesta terça, um dia sem grandes novidades na frente dos dados, parte do movimento pode ser atribuído a uma realização de lucros recentes após forte movimento de tomada de riscos, enquanto o mundo aguarda novos sinais da política monetária do Fed”, diz Zogbi.
A tônica dos mercados tem sido a perspectiva cada vez mais consolidada de que os juros dos Estados Unidos poderão cair já na próxima reunião do Fed, marcada para setembro. “A perspectiva é de recuperação dos ativos de maior risco devido a indicadores que serviram de suporte para espantar por hora os temores de recessão global”, disse Marcio Riauba, gerente da Mesa de Operações da StoneX Banco de Câmbio.
“O conjunto de dados mostra que o ciclo de cortes de juros nos Estados Unidos pode ser iniciado sem que haja necessidade de uma redução mais agressiva, completa Riauba. Com os temores de uma recessão, um corte de 0,50 ponto percentual na taxa de juros -atualmente na faixa de 5,25% e 5,50%- era a aposta majoritária, com especulações até de uma reunião extraordinária do Fed para adiantar o ciclo de afrouxamento.
Agora, uma redução inicial de 0,25 ponto se tornou a de maior probabilidade, com endosso de 69,5% dos investidores, segundo a ferramenta CME FedWatch. Uma das diretoras do Fed, Michelle Bowman, porém, disse nesta terça que continua cautelosa em relação a qualquer mudança na política monetária, pois vê riscos contínuos de alta para a inflação.
Embora ela tenha se abstido, pela segunda vez, de dizer que está pronta, se necessário, para elevar ainda mais a taxa básica, como já foi sua posição anteriormente, ela ofereceu poucos indícios de que esteja pronta para apoiar um corte nos juros na reunião do Fed de 17 e 18 de setembro, como agora é amplamente esperado.
O dólar costuma se depreciar à medida que o Fed reduz os juros. Em tese, a moeda americana se torna comparativamente menos atrativa em relação a outras divisas quando os rendimentos dos títulos ligados ao Tesouro dos EUA, chamados de treasuries, caem.
A mesma lógica se aplica à Bolsa brasileira e a outros mercados acionários. Quando há queda nos treasuries, considerados os ativos mais seguros do mundo, os investidores se voltam aos de maior risco. Isso explica, em grande parte, a atual disparada do Ibovespa.
Com esse pano de fundo, os agentes financeiros agora olham para o calendário da semana. Na quarta-feira, será divulgada a ata da última reunião do Fed, e, entre quinta e sábado, ocorre o encontro de autoridades de bancos centrais em Jackson Hole, no estado de Wyoming, nos EUA.
O destaque do simpósio será o discurso do presidente do Fed, Jerome Powell, na sexta-feira, com expectativa por sinais sobre a trajetória dos juros. Roberto Campos Neto, chefe do BC (Banco Central), dará palestra no sábado.
(Folhapress)